sexta-feira, 10 de abril de 2009

Univesp pode sobrecarregar docentes da USP

retirado do site da Adusp | 24 de novembro de 2008

Educação à Distância foi tema do debate em 18/11

O debate “Ensino à Distância na USP?”, organizado pelo DCE-Livre Alexandre Vannucchi Leme e centros acadêmicos da Pedagogia (“Professor Paulo Freire”) e da Biologia (Cabio), realizado em 18/11, com participação de professores e estudantes, foi marcado por fortes críticas à Universidade Virtual do Estado de São Paulo (Univesp), do governo estadual, bem como à adesão da USP ao projeto.

Em 2009, a Univesp deverá oferecer cursos virtuais de graduação em Pedagogia, Biologia e Ciências para 6.600 professores dos ensinos fundamental e médio, e de pós-graduação para outros 110.000 (vide reportagem “‘Pós’ à distância para professores? Serra manda, USP acata!”, Informativo Adusp 269).

No debate, na Faculdade de Educação (FE), houve questionamentos à concepção de ensino aligeirado, aos métodos autoritários de implantação — e mesmo, no tocante à USP, sem debate e sem a devida aprovação dos novos cursos em instâncias como o Conselho de Graduação (CoG) — e no uso com fins eleitorais.

O professor César Minto, da FE e vice-presidente da Adusp, enfatizou, ao fazer a exposição inicial, a necessidade do ensino presencial no processo de formação e a importância da interação professor-estudantes-objetos de conhecimento. Para ele, o uso do EàD como substituto do ensino presencial (e não como técnica complementar que pode ser bastante útil em situações específicas) encaixa-se numa visão de universidade contrária ao tripé ensino-pesquisa-extensão e que sempre subordina a expansão de vagas a formas alternativas de qualidade discutível.

César ponderou que, “no Estado mais rico da nação”, a rede estadual de ensino não tem, a rigor, “bibliotecas e laboratórios, nem previsão de ter”. Lembrou que diversos países com déficit educacional investiram em média 10% do PIB na educação, enquanto no Brasil investe-se menos de 4% do PIB; e que, diante do impacto das revelações da CPI da Educação (2000), o governo optou pelas seguintes respostas: 1) gratificações para os professores e 2) oferta de cursos modulares, aligeirados, e com expressiva carga horária à distância, como os denominados “PEC/FOR PROF” e os atuais.

“Tudo muda!”

O professor Gil Marques, do Instituto de Física e titular da Coordenadoria de Tecnologia da Informação (CTI), foi o único a defender entusiasticamente a Univesp. “Tudo muda. Os conceitos que a gente entende que se aplicam ao processo de ensino-aprendizagem podem hoje não servir mais. Estamos diante de novas tecnologias. Tudo está ficando diferente!”, disse. Para ele, ocorreu uma “mudança de paradigma”.

Gil considera que a USP tem uma “dívida social”, na medida em que existe um “enorme número de professores sem formação adequada” e que não dominam o conteúdo. Por isso, propõe que sejam ofertados “novos cursos de licenciatura de claro interesse social”, e seja agregado “um pouco mais de valor ao ensino, usando os novos materiais didáticos” (a partir das tecnologias digitais). No decorrer do debate, ele admitiu que o número inicial de vagas dos cursos de graduação é excessivo: “Certamente 5.000 acho demais”.

Bem diferente foi a posição defendida pela professora Maria Clara Di Pierro, membro da “Comissão de Acompanhamento da Univesp”, criada pela congregação da Faculdade de Educação. Para ela, as chamadas novas tecnologias “podem ser recursos úteis, mas são inapropriadas para a formação inicial na graduação”.

Maria Clara enxerga nos cursos propostos uma série de problemas e riscos, a começar pelo que chamou de “naturalização da impossibilidade de expansão do ensino superior presencial”. Relatou que a proposta, feita há tempos, de criação de um curso matutino na Faculdade de Educação “não anda”, porque não há interesse da universidade em ampliar a folha de pagamento com as necessárias contratações de pessoal.

Entre as incongruências da Univesp, ela assinalou o fato de que a oferta de cursos não se baseia em estudos criteriosos de demanda e de impacto sobre o mercado de trabalho. Para a professora da FE, “pensado exclusivamente para licenciatura”, o projeto subentende a criação de profissionais de qualidade diferenciada, o que é condenável: “Não vamos formar físicos à distância, mas vamos formar professores de física à distância”, exemplificou.

“Sobretrabalho”

A Univesp, considera Maria Clara, opera com a idéia de ociosidade na jornada de trabalho docente, pois a própria reitora Suely Vilela informou que ninguém será contratado para esse projeto. “A idéia de que existe um ‘banco de horas’ dos professores que poderá ser utilizado na Univesp preocupa, pois existe o risco de sobretrabalho, de intensificação do trabalho docente”, adverte a professora, lembrando que a questão dos tutores e da estruturação das aulas não está sendo pensada.

O professor Bayardo Torres, do Instituto de Química, membro do grupo de trabalho que planejou o currículo de licenciatura à distância em Ciências, na gestão Adolpho Melfi, relatou a experiência: “Foram dois anos estruturando um currículo inteiramente novo”, esclareceu. No seu entender, nenhum curso pode ser aprovado ou reprovado simplesmente por ser presencial ou à distância: “O CoG aprova caso a caso”, frisou.

Ele realçou a importância da parte presencial do curso (45% da carga, no seu projeto). “Ninguém pensa em fazer um laboratório virtual”, disse. “Professor tem que ter estágio supervisionado”, acrescentou, em resposta a uma questão levantada pela professora Maria Clara. Segundo Bayardo, a criação de um Instituto do Aprendizado Eletrônico (nos moldes propostos por Gil Marques) é “imprescindível”. Ele declarou-se “completamente favorável” à implantação da Univesp, desde que dentro desse modelo.

Flávia Ferrari, estudante de Biociências e membro do DCE, criticou os pressupostos do projeto Univesp. Afirmou que um estudo do MEC, de 2007, mostra que nas áreas cobertas pelas graduações oferecidas há mais licenciados do que a demanda existente. “A questão não é a falta de professores, mas a falta de estímulo”, criticou. A Congregação do IB aprovou, segundo Flávia, proposta de um pró-labore de 60% do salário aos docentes da unidade que vierem a participar da Univesp.

Na mesma linha, Flávio Petracioli, estudante de Geo­grafia, também integrante do DCE, introduziu novos elementos no debate, ao reproduzir declarações de dirigentes de universidades virtuais européias (Open University e Universidade de Hagen, na Alemanha) que literalmente vinculam o EàD às forças de mercado e ao neoliberalismo. Ele informou que as congregações da FFLCH e do IQ rejeitaram a Univesp, que só teria sido aprovada pela congregação do IB.

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